Em 2007, a Uipa denunciou ao Ministério Público os abusos e maus-tratos cometidos com animais no programa infantil “Bom Dia & Cia”.
Em representação elaborada por sua presidente, a advogada Vanice Teixeira Orlandi, a Uipa sustentou que as provas apresentadas no programa impunham sofrimento físico e mental, em menor ou maior grau, aos animais envolvidos. Arrolada como testemunha pelo Ministério Público, a advogada esclareceu que cinco das doze provas exibidas no programa usavam animais. Uma delas simulava uma partida de futebol, em que uma bola semitransparente era posta sobre uma mesa com dois gols. Como o rato era colocado dentro da bola, os movimentos que fazia o animal para livrar-se do que o aprisionava causavam o deslocamento dessa bola sobre a mesa, em direção aos gols. Um dos adolescentes que apresentava o programa comportava-se de forma a elevar a situação penosa do roedor, pulando e girando, enquanto segurava a bola, antes de atirá-la sobre a mesa. Em meio a gestos bruscos, os adolescentes que apresentavam o programa gritavam para simular o clima de uma torcida de futebol. Dessa forma, além do sofrimento físico, havia ainda todo o temor que a situação causava ao animal.
Frisou que a conduta viola, inclusive, o relógio biológico da espécie, pois os roedores são animais de hábitos noturnos, que jamais se expõem à luz do dia, permanecendo em seus abrigos até que anoiteça, mas no programa em questão são forçados à exposição de numerosas e intensas luzes artificiais de um estúdio de TV. A advogada abordou ainda o agravante fato de o programa ser dirigido a um público infantil, no qual se incute a ideia de que o animal é objeto de diversão, um mero brinquedo, e não um ser vivo. Ensina-se que o sofrimento de seres vivos é algo divertido e prazeroso. Em vez de educar a criança para que ela adquira limites em seus atos para com qualquer ser vivente, estimula-se o descaso pela vida e pela dor, incitando à violência e ao pernicioso sadismo.
A Uipa solicitou parecer sobre o tema à Professora Doutora Paula Brugger, graduada em Ciências Biológicas, mestra em Educação e doutora em Ciências Humanas. Do parecer, destaca-se o seguinte trecho:
“Ao banalizar o uso de animais para fins de diversão, ignorando sua condição de seres sencientes, o “Bom Dia e Cia” reforça valores que se coadunam com atos de exploração de animais, além de reforçar uma paradigma que se encontra no cerne da atual crise ambiental. Em nenhum momento se questiona se temos o direito de nos divertir às custas da liberdade dos animais; se eles estariam fazendo tais peripécias de bom-grado; se, para eles, aquelas situações são estressante ou desagradáveis; ou como seriam suas vidas caso não fossem obrigados a estar ali para divertir os humanos. As brincadeiras são estúpidas, pois além de causar danos aos animais (no mínimo estresse), associam vitórias e prêmios a comportamentos caóticos por parte dos animais, quando poderiam ser premiações que incentivassem o aprimoramento de habilidades – físicas ou intelectuais – das crianças (…) Se queremos viver num mundo melhor agora e almejamos o mesmo para as gerações vindouras, é hora de tecermos com mais critério a trama de conteúdos que nortearão as atitudes dos que se encontram hoje numa fase extremamente permeável a novas ideias e valores: a infância.”
Segue trecho da sentença proferida nesta última Quinta-Feira, dia 25, pela juíza Andrea de Abreu e Braga:
“julgo PARCIALMENTE PROCEDENTE a ação para que se abstenha de exibir no programa televisivo Bom Dia & Cia animais em situações abusivas, que atentem contra sua natureza ou os exponha a situações vexatórias, dolorosas ou acima de suas forças, mormente que cesse a utilização de animais em gincanas durante o programa, no prazo de 24 horas, pena de aplicação de multa no valor de R$500.00,00 para cada exposição indevida. Outrossim, condeno a ré a pagar indenização pelos abusos praticados no valor de R$1.000.000,00, valor este a ser revertido a fundo Especial em Defesa dos Direitos Difusos, preferencialmente relacionado a interesses animais.